11 março, 2006

Poder Constituinte


Introdução:

Quem teorizou acerca do Poder Constituinte foi o abade de Sieyès, pensador e revolucionário francês do século XVIII. Em fevereiro de 1789 ele publicou um panfleto revolucionário intitulado, “O que é o terceiro Estado?”. Este panfleto continha as reivindicações da burguesia, que foram conquistadas com a revolução francesa.

A nação existe antes de tudo, ela é a origem de tudo. Sua vontade é sempre legal, é a própria lei. Antes dela e acima dela só existe o direito natural. Se quisermos ter uma idéia exata da série de leis positivas que só podem emanar de sua vontade, vemos, em primeira linha, as leis constitucionais que se dividem em duas partes: umas regulam a organização e as funções do corpo legislativo; as outras determinam a organização e as funções dos diferentes corpos ativos. Essas leis são chamadas de fundamentais não no sentido de que se podem tornar independentes da vontade nacional, mas porque os corpos que existem e agem por elas não podem tocá-las. Em cada parte a Constituição não é obra do poder constituído, mas do poder constituinte. Nenhuma espécie de poder delegado pode mudar nada nas condições de sua delegação. É neste sentido que as leis constitucionais são fundamentais. As primeiras, as que estabelecem a legislatura, são fundadas pela vontade nacional antes de qualquer constituição; formam seu primeiro grau. As segundas devem ser estabelecidas por uma vontade representativa especial. Deste modo todas as partes do governo dependem em última análise da nação" (Emmanuel Joseph Sieyès)

Na França revolucionária (1789) foram superadas as velhas teorias que determinavam a origem divina do poder, afirmando a partir de então que a nação, o povo (seja diretamente ou através de uma assembléia representativa), era o titular da soberania, e, por isso, titular do Poder Constituinte. Entendia-se então que a Constituição deveria ser a expressão da vontade do povo nacional, a expressão da soberania popular”. (José Luiz Quadros de Magalhães)

O Poder Constituinte, portanto, é poder constituído e não fruto de qualquer outro poder. Sieyès estabeleceu essa distinção partindo da idéia de “nação” (despossuída de organização política), a partir do momento em que a nação passa a ter organização política ela se transforma em Estado.

O Estado é a nação politicamente organizada e, dessa organização é que brotam os três Poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. (que na verdade são funções, já que o Poder Político é soberano, único, indivisível e indelegável, como regra)

Sendo fruto do Poder Constituinte, a Constituição não é produto de nenhum desses “Poderes”, porque esses “Poderes” é que são produtos da Constituição. O Poder Constituinte antecede à organização política do Estado, existe num momento anterior à organização política do Estado.

Sendo o Estado um ente, uma pessoa política, que manifesta sua vontade através de seus órgãos diretivos, quais sejam, quando diz lei através do Poder Legislativo (Estado-legislador); pelo ato administrativo através do Poder Executivo (Estado-administrador) e, se o caminho for o Poder Judiciário, sua manifestação de vontade se dá através da decisão judicial (sentença ou acórdão), é o Estado-juiz.

Nenhuma dessas manifestações (lei, ato administrativo ou decisão judicial) tem o poder de criar ou alterar o texto constitucional, porque o que vige é o princípio da supremacia da Constituição. A Constituição tem por origem uma manifestação da vontade da nação e não uma manifestação de vontade do Estado.

A lei, o ato administrativo e a decisão judicial são manifestações de vontade do Estado, mas a Constituição é produto de manifestação da vontade da nação.

Em resumo, o Poder Constituinte é o fundamento de validade da Constituição, que por sua vez, é o fundamento de validade dos “Poderes” do Estado (Legislativo, Executivo e Judiciário), de onde emanam a lei, o ato administrativo e a decisão judicial (acórdão ou sentença).

Conceito:

Pode-se conceituar Poder Constituinte como o poder de criar ou reformar (revisar ou emendar) a Constituição.

No Brasil, face ao sistema federativo instituído e consagrado desde a Constituição Republicana de 1891, os Estados-membros integrantes da federação, possuem competência para organizarem-se conforme suas Constituições Estaduais, bem como, de acordo com as leis adotarem, desde que, seus ordenamentos jurídicos próprios não firam aos ditames da Constituição Federal.

Art. 25 da CF/88 - “Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição”.

Então, se os Estados-membros podem criar e reformar suas Constituições, ainda que somente no âmbito estadual, também há o exercício do Poder Constituinte. Assim, ampliando o conceito inicial de Poder Constituinte, define-se a este como o poder de criar e de reformar a Constituição e, no Estado Federado, de organizar os Estados-membros.

Na federação brasileira, existem 26 Estados-membros, e cada um possui a sua Constituição. O Distrito Federal, face as sua característica “híbrida” de funcionamento, ora com competência própria de Estado-membro, ora com competência municipal, não possui uma Constituição, tendo como referencial máximo de sua organização a Lei Orgânica.

No dizer de Nagib Slaibi Filho, enquanto na Constituição passada, “o Distrito Federal é mais que um Município e menos que um Estado”, sob o regime constitucional atual afirma: “é um super-Estado pois o art. 32 lhe assegura a autonomia política pela eleição direta do Governador e do Vice-Governador, bem como dos deputados distritais que comporão sua Câmara Legislativa e, além disso, que ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios”.

Art. 32 - O Distrito Federal, vedada sua divisão em Municípios, reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços da Câmara Legislativa, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição.
§ 1º - Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios.
§ 2º - A eleição do Governador e do Vice-Governador, observadas as regras do art. 77, e dos Deputados Distritais coincidirá com a dos Governadores e Deputados Estaduais, para mandato de igual duração.
§ 3º - Aos Deputados Distritais e à Câmara Legislativa aplica-se o disposto no art. 27.
§ 4º - Lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito Federal, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar.


Titular e exercentes do Poder Constituinte

Observação:

Isoladamente afirmamos que o titular do Poder Constituinte é quem detém a soberania. Nos Estados democráticos, a titularidade pertence ao povo, decorrendo a soberania da vontade popular. Nesses Estados, o consenso (consensus), que não equivale a unanimidade, é o fundamento de validade do Poder Constituinte.

Já nos Estados totalitários, onde o Poder do Estado foi obtido através da força, o titular é quem detém o Poder, para criar ou modificar a Constituição, independentemente da vontade popular, confundindo-se titular e exercente em uma só pessoa.

Afirmam os autores, em esmagadora maioria, ser o povo o titular do Poder Constituinte, entretanto, o seu exercício nem sempre tem se realizado democraticamente, portanto, preferimos atribuir a titularidade há quem detém a soberania, embora saibamos que nossa posição seja isolada.

Na dogmática tradicional, distingue-se a titularidade e o exercente do Poder Constituinte, onde nem sempre o titular é o exercente e, nem sempre o exercente é o titular.

Há um consenso teórico quanto aos exercentes (agentes), dizendo que são aqueles que exercem o Poder Constituinte em nome do povo, entretanto, tal exercício pode ser legítimo ou ilegítimo, portanto, as Constituições podem ser impostas (outorgadas) ou consensuais (promulgadas).

Os exercentes legitimados pelo povo surgem quando são eleitos para assembléias ou convenções constituintes, bem como, quando conduzem comandos revolucionários, encarregados de instauração de uma nova ordem social querida pelo povo (consenso). Já os exercentes ilegítimos seriam os lideres dos golpes de Estado, agentes não de um desejo de nova ordem social, de um querer do povo, mas autores de um movimento jurídico respaldado pela força.

Embora particularmente veja com clareza a distinção entre a revolução e golpe de Estado, entendendo que na primeira situação foi vencedor o povo através de seus lideres, que atendendo ao consenso da sociedade depuseram o tirano ilegítimo, enquanto que na segunda situação, no golpe, tal legitimação popular não existe, não sendo o movimento outra coisa senão usurpação do Poder em nome pessoal ou de um grupo, não é pacífica essa compreensão entre os autores. A propósito, o professor Nagib comenta, que “a distinção entre revolução e golpe de Estado é uma distinção que foge ao campo jurídico, devendo ser notado que disse alguém, humoristicamente, que a diferença entre o subversivo e o revolucionário é que o segundo foi vencedor”.

De tudo que, observe-se, entretanto, que nos três caso citados (assembléia, golpe ou revolução), houve exercício do Poder Constituinte, o que se questiona é se esse exercício é legítimo ou ilegítimo.


Espécies de Poder Constituinte

Ao poder de criar uma nova Constituição, uma nova ordem social, um novo Estado dá-se o nome de Poder Constituinte Originário. Enquanto que, ao poder que retira do próprio texto Constitucional suas forças para reformar esse mesmo texto, dá-se o nome de Poder Constituinte Derivado.

Segundo o professor Alexandre de Moraes, são características dessas duas espécies de Poder Constituinte:

Originário:

O Poder Constituinte caracteriza-se por ser inicial, ilimitado, autônomo e incondicionado” (e permanente).
O Poder Constituinte é inicial, pois que sua obra – a Constituição – é a base da ordem jurídica.
O Poder Constituinte é ilimitado e autônomo pois não está de modo algum limitado pelo direito anterior, não tendo que respeitar os limites postos pelo direito positivo antecessor.
O Poder Constituinte também é incondicionado, pois não está sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar sua vontade; não tem ela que seguir qualquer procedimento determinado para realizar sua obra de constitucionalização.
Ressalte-se ainda que o Poder Constituinte é permanente, pois não desaparece com a realização de sua obra, ou seja, com a elaboração de uma nova Constituição. Como afirmou Sieyès, o Poder Constituinte não esgota sua titularidade, que permanece latente, manifestando-se novamente mediante uma nova Assembléia Nacional Constituinte ou um ato revolucionário
”.

Derivado:

Apresenta as características de derivado, subordinado e condicionado. É derivado porque retira sua força da do Poder Constituinte originário; subordinado porque se encontra limitado pelas normas expressas e implícitas no texto constitucional, às quais não poderá contrariar, sob pena de inconstitucionalidade; e, por fim, condicionado porque seu exercício deve seguir as regras previamente estabelecidas no texto da Constituição Federal”.

Cite-se ainda o Poder Constituinte Derivado Decorrente, referente ao art. 25 da Constituição Federal, organizando os Estados-membros da federação, já anteriormente comentado. É decorrente do Poder Constituinte Derivado, sendo subordinado, condicionado e limitado.


Formas históricas de manifestação do Poder Constituinte originário

Podem-se relacionar historicamente algumas formas de manifestação do Poder Constituinte, ou seja, através de Assembléia Nacional Constituinte, revoluções, golpes de Estado, além do chamado método “bonapartistas”, ou “cesarista”, que se desenvolveu através de plebiscito. Refere-se a Napoleão Bonaparte. Ele editou as Constituições francesas (1799, 1802 e 1804), tal método consistia em perguntar ao povo, após a elaboração da Constituição, se estava ou não de acordo com o texto pronto e acabado. Sem dúvida, era uma farsa.

Quanto ao Poder Constituinte derivado, este só se manifesta através do órgão instituído pela Constituição, é ela que vai dizer como e quando poderá ser alterada.


Alteração da norma constitucional

A Constituição pode ser alterada de maneira formal (reforma), sendo por Revisão Constitucional ou por Emenda Constitucional, nos termos do art. 60 da CF/88, ou de maneira informal (mutação), através da interpretação ou aplicação dos usos e costumes constitucionais.

Quando a Constituição é alterada pela via formal, há alteração do texto constitucional, através de um novo comando editado pelo legislador constituinte derivado, ou seja, dentro dos limites traçados de conteúdo e, da maneira prescrita no próprio texto constitucional, poderá haver alteração do texto constitucional se assim quiser o titular do Poder Constituinte, através do órgão encarregado e autorizado para tal modificação.

Quando a alteração se dá pela via informal, não há modificação da letra da lei, havendo alteração do significado, alcance da norma ou do conteúdo constitucional em razão da interpretação ou aplicação dos usos e costumes.


Observamos que a Constituição de 1934 estabeleceu diferença entre emenda e revisão, sendo a primeira instrumento de alteração de alguns dispositivos do texto constitucional; e sendo a segunda um processo de alteração amplo, geral e ilimitado, teoria que não é perfeita vez que a revisão é produto do Poder Constituinte derivado e este, como já visto, tem como características ser secundário, condicionado e limitado. Na prática confundem-se os dois instrumentos de alteração, não sendo de maior importância essa distinção.

Outro ponto a ser considerado no trato das alterações do texto constitucional, são os limites dessas modificações. O legislador constituinte originário, estabeleceu limites ao poder de reforma do texto constitucional, assim, esse poder é absoluto, é limitado, porque é produto do Poder Constituinte derivado.

Três são as limitações ao poder de modificação do texto constitucional: a) limitação temporal; b) limitação circunstancial; e c) limitação material ( expressa / implícita ).


Limitação de ordem temporal – Algumas Constituições limitam a alteração da norma constitucional a um período temporal, com o objetivo de permitir a maturação do texto constitucional. Observe-se, entretanto, que no Brasil não há mais limitação temporal. A referência é feita ao nível de direito constitucional comparado.

No Brasil historicamente, podemos registrar a Constituição de 1824, onde no seu art. 174 falava em 4 anos para se poder modificar ou acrescentar emenda;

Art. 174. Se passados quatro anos, depois de jurada a Constituição do Brasil, se conhecer que algum dos seus artigos merece reforma, se fará a proposição por escrito, a qual deve ter origem na Câmara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte deles.

Também a Constituição francesa de 1741 possuia limitação temporal para aceitar sua alteração.


Limitação de ordem circunstancial – Inibe a alteração do texto constitucional diante da ocorrência de determinadas circunstâncias. Na Constituição brasileira temos a proibição de modificação de seu texto, durante a vigência de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio (art. 60, § 1º). É medida garantidora dos princípios democráticos.

Limitação de ordem material – Inibe a alteração do texto constitucional em face de determinadas matérias. Segundo o Prof. Nelsom de Souza Sampaio, essas limitações podem ser expressas ou implícitas.

Exemplos:

Expressa - está localizada nas cláusulas pétreas – art. 60, § 4º da CF/88

Art. 60 - A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.

Implícita - está fora do poder de reforma , ainda que não explicitamente.

São 3 exemplos:

1º - Titularidade do Poder Constituinte originário (art. 1º, § único). motivo = princípios fundamentais e regime adotado pela Constituição democrática.

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.

Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.


2º - Titularidade do Poder Constituinte de reforma (art. 60 e § 2º da CF/88) motivo = princípios fundamentais e regime adotado pela Constituição democrática.

Art. 60 - A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

3º - Processo de reforma da Constituição – (Art. 34, VII, a, da CF/88) motivo = princípios fundamentais e regime adotado pela Constituição democrática. Forma Federativa de Estado.

Art. 34 - A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;


Natureza Jurídica do Poder Constituinte Originário

Quando se pergunta qual a natureza jurídica de alguma coisa, quer se saber o que aquela coisa representa para o Direito. Assim, abordando finalmente esse ponto, indaga-se qual a natureza jurídica do Poder Constituinte Originário.

É matéria controvertida. Para uns é poder de fato, para outros é poder de direito.

Seguindo-se a primeira corrente, pode-se afirmar que é Poder de Direito, isto porque o Poder Constituinte não está fundado em norma de Direito. Para essa corrente o Direito só é Direito enquanto norma escrita. Como antes do Poder Constituinte não existia norma não existia direito.

Se aceitarmos a segunda corrente, vamos dizer que a natureza é de Poder de Fato, isto sustentado em princípios de Direito natural. Para essa corrente, mesmo que houvesse norma escrita, já existia anteriormente o Direito, os homens se organizavam e se adequavam a normas naturais para a convivência.

05 março, 2006

ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E SEUS FUNDAMENTOS


Preceitua a Constituição Federal:

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.

Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Do entendimento do artigo transcrito verificamos o nome e sobrenome desse país chamado Brasil.

Fez o legislador constituinte de 1988 uma opção, qual seja, somos uma República (coisa pública). Assim nas palavras de Geraldo Ataliba, lembradas pelo Prof. Nagib Slaibi Filho, “a simples menção ao termo república já evoca um universo de conceitos, intimamente relacionados entre si, sugerindo a noção do princípio jurídico que a expressão quer designar. Dentre tais conceitos, o de responsabilidade é essencial. Regime republicano é regime de responsabilidade. Os agentes públicos respondem pelos seus atos. Todos são assim, responsáveis”.

Outras características de nossa República são as seguintes: alternância do exercício do poder, pela temporariedade de exercício do poder e pelo regime representativo. Ao contrário, na monarquia se considerava que o Poder Político decorria tão e somente do soberano, não respondendo o mesmo por seus atos e sendo vitalício nas suas funções.

Também optou o legislador constituinte de 88 pela forma federativa de Estado, ou seja, mais de um nível de Poder, representado pelos seus entes: União, Estados e Municípios, que além de caracterizar uma descentralização política e administrativa, “fraciona” o exercício do Poder soberano do Estado. Cada ente da federação tem suas competências delimitadas no texto constitucional, garantindo um maior controle da sociedade sobre o exercício e os exercentes do Poder Político.

Também na redação do art. 1º, os constituintes optaram pela consagração nome Brasil. Denominação conhecida mundialmente e formada no caminhar histórico da formação de sua unidade territorial. Creio que não há muito que acrescentar que não seja do conhecimento de todos, a origem do nome Brasil já nos foi apresentada desde o início de nossos estudos, ainda no 1º grau.

Prosseguindo no entendimento do artigo primeiro, observamos que esse Brasil é formado pela “união indissolúvel” dos entes que compõem a federação. De maneira sucinta podemos afirmar que quis o legislador originário preservar a integridade nacional, impedindo qualquer hipótese de divisão territorial e política, não aceitando outra soberania em solo brasileiro.

Prevê ainda o artigo transcrito, que o Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito.

A palavra rechtsstaat, correspondente a Estado de Direito, aparece no início do século XIX no direito constitucional alemão. No dizer do professor português José Joaquim Gomes Canotilho, talvez o maior constitucionalista vivo, “o Estado de Direito começou por ser caracterizado, em termos muito abstratos, como ‘Estado da Razão’, ‘estado limitado em nome da autodeterminação da pessoa’. No final do século, estabilizaram-se os traços jurídicos essenciais deste Estado: o Estado de Direito é um Estado Liberal de Direito. Contra a idéia de um Estado de Polícia que tudo regula e que assume como tarefa própria a prossecução da ‘felicidade dos súditos’, o Estado de Direito é um Estado Liberal no seu verdadeiro sentido”.

Portanto, a origem do Estado de Direito reside nos ideais dos Estados liberais, sofrendo salutar mitigação em seu sentido originário com o surgimento dos ideais sociais, reproduzidos através nas chamadas Constituições sociais a partir do inicio do século XX.

A proposta sumária de apresentação dessa análise, entretanto, faz com que a abordagem seja a mais direta e clara possível, assim, num conceito formal podemos dizer que Estado de Direito “Implica na constituição de Estados limitados pelas regras jurídicas que marcam seu fundamento…a doutrina reconhece, internacionalmente, o Estado de Direito como aquele no qual a legalidade é critério observado pelo exercício do poder” ( Júlio Aurélio Vianna Lopes )

Quanto a opção por ser um Estado Democrático, Nagib afirma que “a Constituição é, talvez, redundante, no emprego da expressão ‘Estado Democrático de Direito’, porque já estão indissociáveis as idéias de prévia regulamentação legal e democracia”.

Para os mais formais, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira define em seu dicionário da língua portuguesa a palavra democracia da seguinte forma: “Doutrina ou regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição eqüitativa do poder, ou seja, regime de governo que se caracteriza em essência, pela liberdade eleitoral, pela divisão dos poderes e pelo controle da autoridade”.

É o conceito de democracia um dos mais difíceis de ser formulado, existindo inúmeras visões e teorias quanto a sua elaboração, visto estar ligado diretamente aos valores ideológicos de quem o formule.

Reafirmando a idéia inicial de Nagib, sobre o Estado constitucional democrático afirma Canotilho: “O Estado Democrático é ‘mais’ do que Estado de Direito. O elemento democrático não foi apenas introduzido para ‘travar’ o poder (to check the power); foi também reclamado pela necessidade de legitimação do mesmo poder (to legitimize State power). Se quisermos um Estado constitucional assente em fundamentos metafísicos, temos de distinguir claramente duas coisas: (1) uma é a legitimação do direito, dos direitos fundamentais e do processo de legitimação do sistema jurídico; (2) outra é a da legitimação de uma ordem de domínio e da legitimação do exercício do poder político. O Estado ‘impolítico’ do Estado de Direito não dá resposta a este último problema: donde vem o poder. Só o princípio da soberania popular segundo o qual ‘todo poder vem do povo’ assegura e garante o direito à igual participação na formação democrática da vontade popular. Assim, o princípio da soberania popular concretizado segundo procedimentos juridicamente regulados serve de ‘charneira’ entre o ‘Estado de Direito’ e o ‘Estado Democrático’ possibilitando a compreensão da moderna fórmula Estado de Direito Democrático”.

Por conclusão afirma-se que O Brasil é um Estado de Direito porque possui nas leis a limitação do exercício do poder político e, é um Estado Democrático porque o poder político é subordinado a soberania popular.

Prosseguindo na análise do artigo vestibular da Constituição, lê-se que esse Estado Democrático de Direito possui alguns fundamentos expressos e numerados, não exaustivos, entretanto, quanto a outros princípios existentes na própria Constituição.

São fundamentos destacados:

I – Soberania

A expressão deve ser analisada sob duas óticas, vez que a soberania pode ser considerada o principal atributo da existência do próprio Estado.

Sob o ponto de vista interno, é a afirmação da existência de um só Poder, insubordinado a qualquer outro poder ou organização, é a própria existência de um Estado que se faz presente pela efetividade das leis, dos atos administrativos e das decisões judiciais. “Se o exercício do poder é condicionado, não é poder soberano”.

Observe a afirmação quanto a existência de um só Poder, havendo, todavia, a divisão (horizontal) dos Órgãos do Poder para o exercício de suas funções (Legislativo, Executivo e Judiciário). Importante tal observação, para que seja compreendido desde logo que o Poder Político não se divide, é uno e soberano e indelegável de regra, o que existe verdadeiramente é a divisão de suas funções, exercida pelos Órgãos desse Poder.

Sob o ponto de vista externo, é a representação da soberania do povo brasileiro nas relações com outras soberanias. É a manifestação da vontade nacional nas questões internacionais, de forma livre e incondicionada a qualquer outro Estado.

II – Cidadania

Conceitualmente é o exercício pleno de vários tipos de direitos civis, políticos e sociais. Também no mesmo sentido amplo, são os deveres que regem e definem a situação dos habitantes do Brasil.
É a cidadania o conjunto de direitos e liberdades políticas sociais e econômicas, já estabelecidos ou não pela legislação. Nas palavras de Dalmo de Abreu Dallari, “a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social”.

III – Dignidade da pessoa humana

Valores que vão além do querer do indivíduo, valores intocáveis e assegurados na Constituição para um efetivo exercício do Estado Democrático de Direito.

O respeito à condição humana deve ser superior a qualquer outro interesse do Estado, que deve se subordinar e adequar a esse querer constituinte. É fundamento, portanto, não pode ser tratado de maneira secundária.

Da mesma forma que condenados custodiados pelo Estado devem receber tratamento digno e superior ao mínimo aplicado aos animais de um zoológico, também os idosos não devem estar subordinados aos desarranjos administrativos que por vezes os colocam com aposentadorias aviltantes ou abandonados em filas de recadastramento em pleno sol de meio dia, ainda, a dignidade de estar presente desde a condução em transportes coletivos para os deficientes físicos até a recepção numa delegacia policial de um cidadão que tenha sofrido um atentado.

Em suma, no dizer simples de Willian Lofy, “podemos dizer que a Dignidade da Pessoa Humana está na qualidade intrínseca e indissociável de todo ser humano, por este ser titular de direitos e deveres fundamentais, que, sendo respeitados e assegurados pelo Estado, proporcionam condições mínimas para uma vida digna em harmonia com os demais seres humanos”.


IV – Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa

As atividades produtivas devem cumprir seu papel social, deve prestigiar a própria existência da propriedade e dos frutos que possam advir dessa opção, mas nunca pode se sobrepor a cidadania e a dignidade humana, muito pelo contrário, sendo parte integrante do próprio exercício desses direitos.

Por ser uma função de suma importância ao desenvolvimento do país e por ser a fonte de subsistência dos membros da sociedade, este princípio está inserido como norma fundamental de estruturação da sociedade brasileira em que é protegido o trabalho em todas as suas escalas (empregado, empregador, etc...).

É através do trabalho que se fomenta o crescimento da sociedade e da prosperidade coletiva e através da livre iniciativa que optou o constituinte para o desenvolvimento, bem estar e justiça social.


V – Pluralismo político

Pode ser resumido pelo respeito e direito a manifestações de todas as manifestações ideológicas e sua convivência no campo democrático. Não há veto ou censuras ao livre pensar e a manifestação, desde que não atentatórias a própria existência da democracia ou aos princípios fundamentais consagrados em todo o texto constitucional.

É o princípio que garante a todas as pessoas o direito de participar do destino político de país, em que todos são livres para manifestar suas concepções filosóficas e políticas, tendo a liberdade de se organizar ou de participar de algum partido político.


Parágrafo único

Reafirmando e ressaltando o princípio democrático (governo do povo e pelo povo) contido o caput do art. 1º, optou o povo brasileiro pela democracia representativa indireta como regra, onde o Poder Político é exercido em seu nome (titulares do Poder Político) através de seus representantes (exercentes), escolhidos e legitimados através de processos eleitorais.
Inobstante a fórmula principal escolhida, consagra o texto constitucional também a participação popular no exercício do poder pela via direta, nos termos previstos na própria Constituição, prevendo tal manifestação através do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular na propositura de leis, institutos que serão objetos de apreciação em outra oportunidade.

03 março, 2006

Supremacia Constitucional

Muito há o que se discutir no Direito, assunto é o que não falta, todos os dias uma nova lei, não raras também são as emendas constitucionais. O legislador não para. De maneira equivocada, acredita que o país será transformado por obra e graça de suas atividades, já é comum, ignorando a realidade social, as diferenças regionais, culturais e econômicas, indicar, votar e aprovar regramentos genéricos e abstratos, comuns a todos, mas distantes das necessidades gerais. A produção legiferante é vasta, o furor de seus artífices parece não ter limites, são leis penais, civis, tributárias, processuais et coetera.

Acontece que todas essas leis quando são editadas, devem estar adequadas ao ordenamento constitucional vigente. As leis devem ter sua fundamentação no texto constitucional, sob pena de serem possuidoras de um vício, o da inconstitucionalidade. Portanto podemos garantir, que a constitucionalidade das leis é a própria afirmação da supremacia constitucional sobre outras normas de grau inferior. Supremacia constitucional é sinônimo de hierarquia entre o texto Magno e as demais leis.

Muito simples e fácil o raciocínio, entretanto, a técnica não pode ser desprezada para a aferição do vício indicado. Por vezes confunde-se inconstitucionalidade com ilegalidade ou inconstitucionalidade indireta, fato que pode causar uma má interpretação das decisões judiciais e mesmo perturbar o próprio Processo Legislativo. Assim, nesse primeiro texto, o objetivo é o de explicar de maneira simples e objetiva, em que consiste a Supremacia Constitucional, identificando os fenômenos Jurídicos da Inconstitucionalidade e da Ilegalidade. É um primeiro momento, que deve trazer algumas luzes ao estudo do Direito Constitucional.

Nas palavras do Prof. Nagib Slaibi Filho, “a supremacia da Constituição é especial característica que lhe confere predominância sobre as demais normas jurídicas, subordinando-as aos seus comandos”. Citando Humberto Quiroga Lavié prossegue o mestre, “que es la supremacia constitucional? Es la particular relacion de supra y subordinatión en que se encuentran las normas dentro de un ordenamiento jurídico determinado: porque, por virtud de la Constitución del Estado, un ordenamiento deja ser un sistema coordinado de normas (como los es el derecho interacional o como lo fue el derecho consuetudinario o primitivo)

Assim, conceitualmente pode-se afirmar que a Supremacia da Constituição sobre as demais espécies normativas repousa sobre a própria estrutura hierarquizada da estrutura jurídica do Estado.

A Constituição como vértice do sistema jurídico, como a Lex legen (a lei das leis), encontra origem e fundamento no Poder Constituinte, definindo-se este, de maneira sumária, como o poder de criar e reformar as Constituições. É o Poder que institui todos os demais poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), mas não é instituído por qualquer deles. O tema a propósito merecerá destaque e estudo em oportunidade futura, bastando por enquanto o entendimento que, o Poder Constituinte cria e transforma a Constituição, sendo a mesma a maior das Leis, ocupante do ponto mais elevado do ordenamento jurídico de um Estado.

Deve-se a Hans Kelsen a teorização da Supremacia Constitucional, que através de uma visão piramidal, indicou a estrutura escalonada da ordem jurídica do Estado.


Basicamente em duas afirmações sustentam o raciocínio de Kelsen:

1ª afirmação: A ordem jurídica não é um sistema de normas estabelecidas em um mesmo plano. As normas estão estabelecidas em planos diversos.


Obs.1 : Prevê a Constituição no art. 59, sete espécies normativas – normas de 1º grau.

Art. 59 - O processo legislativo compreende a elaboração de:
I - emendas à Constituição;
II - leis complementares;
III - leis ordinárias;
IV - leis delegadas;
V - medidas provisórias;
VI - decretos legislativos;
VII - resoluções.


Obs. 2: São chamadas de Normas de 1º grau, porque inovam o ordenamento jurídico, acima delas só a própria Constituição que é a própria fundamentação de suas existências.

2ª afirmação: A norma superior será sempre o fundamento de validade da norma imediatamente inferior.

Observando a pirâmide e as duas afirmações:

O fundamento de validade da Lei é a Constituição e por conseqüência, o fundamento de validade do Decreto regulamentador é a Lei.
Portanto, o Decreto vai ser uma norma de 2º grau em relação à Constituição e de 1º grau em relação à Lei.

No mesmo raciocínio, o fundamento de validade do Regulamento é o Decreto. Ele, o Regulamento, vai ser norma de 3º grau em relação à Constituição, de 2º grau em relação à Lei e de 1º grau em relação ao Decreto.

Novamente, o fundamento de validade da Portaria é o Regulamento. Portanto, a Portaria é norma de 4º grau em relação à Constituição, norma de 3º grau em relação à Lei, norma de 2º grau em relação ao Decreto e de 1º grau em relação ao Regulamento.

Concluindo o raciocínio, o fundamento de validade da Ordem de Serviço é a Portaria. A Portaria é norma de 5º grau em relação à Constituição, de 4º grau em relação à Lei, de 3º grau em relação ao Decreto, de 2º grau em relação ao Regulamento e de 1º grau em relação a Portaria.

Se todas as normas do 1º grau para baixo têm seu fundamento na norma imediatamente superior, onde estaria o fundamento da Constituição? No Poder Constituinte,

A conseqüência da Supremacia Constitucional, portanto, será o controle de constitucionalidade das normas, ou seja, será a verificação formal (maneira de ser feita) e material (conteúdo) exigida pela Constituição, quando do surgimento de uma nova Lei.

Prevê a Constituição “como” (Processo Legislativo) deverá ser elaborada uma Lei e, “qual o conteúdo” material permitido ou determinado que poderá ter esta Lei.

Inconstitucionalidade X Ilegalidade

Se o fundamento de validade de uma norma encontra-se na norma imediatamente superior, pode-se afirmar então que o fenômeno da inconstitucionalidade só ocorre na relação direta e imediata entre a norma de 1º grau com a Constituição, ou seja, entre a Lei (art. 59) e a Constituição.

Assim, do 2º grau para baixo, inclusive, o controle será de legalidade.
Portanto, um Decreto que aparentemente contrarie a Constituição, na verdade, contraria seu fundamento de validade, a Lei. Também, em outro exemplo, um Regulamento não pode ser considerado inconstitucional, mas sim, ilegal, vez que seu fundamento de validade não reside na Constituição, mas sim no Decreto, que busca seu fundamento na Lei.

Para alguns autores existe ainda a idéia de uma “inconstitucionalidade indireta”, ou seja, por exemplo, supondo que um Decreto venha a ferir a vontade expressa no texto constitucional, ou seja, uma norma de 3º grau que contrarie a Lei maior. Discordando dessa terceira modalidade, o melhor entendimento, é que a “inconstitucionalidade indireta” detectada, não é nada mais, nada menos que o fenômeno da ilegalidade. Citando Marcelo Neves através das linhas Clèmerson Merlin Clève: “o problema da inconstitucionalidade das leis resulta de uma relação imediata de incompatibilidade com a Constituição. A denominada inconstitucionalidade indireta, é antes um problema de ilegalidade, ou incompatibilidade internormativa infralegal”.

02 março, 2006

Escabinos


“O Júri é tribunal de colegialidade heterogênea, como o disse Carnelutti, uma vez que dele participam juizes togados e populares. Nesse tribunal como dizia Aléxis de Tocqueville, funciona ‘um certo número de cidadãos escolhidos pela sorte e revestidos momentaneamente do poder de julgar’: é a participação do elemento popular. De outro lado, porém, como dispõe o art. 433 do Cód. de Processo Penal, integra também o Tribunal do Júri, ‘um juiz de direito, que é o presidente’, - o que constitui a participação da magistratura togada na composição do tribunal.

Todavia, os cidadãos podem participar de juízos de colegialidade heterogênea, não só como jurados, como também na qualidade de escabinos. Daí haver o júri propriamente dito e o tribunal de escabinos, ou escabinado.

No escabinado, há como no Júri, o recrutamento popular, o sorteio e até a divisão do julgamento. Mas, enquanto naquele a responsabilidade do réu é examinada e decidida em conjunto pelos juízes leigos e juízes profissionais, no último só o elemento popular decide sobre a existência e autoria do crime.

O julgamento por escabinos não segue a um modelo único e rígido. No sistema alemão e norueguês, bem como no francês atual e no assessorado italiano, magistrados e leigos decidem em conjunto, havendo pois unidade de competência funcional, sobre todas as questões do julgamento; no sistema que imperava na Sérvia e Bulgária, juízes e leigos decidiam conjuntamente apenas a questão da culpabilidade, ficando para os magistrados a função de aplicar e graduar a pena”. (José Frederico Marques – Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Forense, 1ª ed, 1961))


“Os Schepenen ou escabinos eram magistrados não remunerados, que constituíam câmaras municipais presididas por um Schout, ou esculteto, todos eles escolhidos entre os vizinhos pelo Conselho Supremo. ‘Nos casos ordinários, a justiça era administrada, tanto nas cidades como nas aldeias, pelos escabinos [...] e para tal fim se nomeavam sete e às vezes oito, com a diferença, porém, de que nas cidades os escabinos conhecem indistintamente de todas as causas, não somente cíveis e comuns mas criminais’. O esculteto, além de presidir as sessões da câmara, ‘executa os mandados dos juizes, convoca a Corte Criminal, recolhe os votos, sustenta os direitos do país nas causas publicas e atua como promotor e inquiridor nos processos crimes’”.
Memórias da Justiça Brasileira – Leia mais

“...Com as redes do governo em suas mãos Maurício de Nassau, a Nova Holanda se mantinha em paz, para isto o que muito contribui foi a reforma da administração municipal e a criação das camarás dos escabinos em substituição das antigas e mal organizadas camarás portuguesas, que contava com igual número e o mesmo direito de holandeses e portugueses, e como chefe de administração, procurador do estado e arrecador dos impostos foi colocado o Governador Maurício de Nassau, e para a direção dos hospitais e orfanatos foram chamados os portugueses de Recife, e aos portugueses também foram dados os direito de formarem aos lados dos diretores das diferentes capitanias um corpo consultivo.
Na assembléia geral dos escabinos, portugueses e pessoas consideradas entre os habitantes das capitanias de Pernambuco, de Itamaracá e da Paraíba se reuniram em Recife afim de tratarem da situação política e econômica da Nova Holanda e sobre as medidas a serem adotadas contra os grupos de bandoleiros baianos, esta reunião foi o primeiro parlamento que se reuniu na América do Sul, os representantes portugueses deram um voto de confiança ao Governador Maurício de Nassau porém criticaram severamente a situação em que se achavam e exigiram para a religião católica a igualdade de direito em relação ao calvinismo”.
Nova Holanda